Êxodo,
de Ridley Scott
ESCRITO
POR NIVALDO CORDEIRO | 12 MAIO 2015
ARTIGOS
- CULTURA
Estas
maravilhas relatadas no livro aconteceram e foram para mostrar que, quem
conhece Javé, não pode compactuar e nem se submeter ao Estado idólatra.
Seu
eu não fosse leitor assíduo da Bíblia e desconhecesse o livro do Êxodo, até
teria gostado da leitura feita por Ridley Scott no seu recente filme Êxodo –
Deuses e Reis. Bela fotografia, Christian Bale está soberbo no papel de Moisés,
a cenografia recria ricamente as cidades egípcias, sua periferia escravizada
composta por israelitas; a recriação do processo produtivo das construções de
monumentos é bastante convincente.
Christian
Bale conseguiu fazer um Moisés viril, destemido, nobre. Sua função de líder
enviado por Deus o tornou uma figura símbolo fortíssima e Bale soube dar
dignidade ao personagem. Um sacerdote e um guerreiro, um profeta, assim fez
Bale retratar esse personagem, muito rente ao texto. Gostei de como foi
apresentado o seu encontro com a família de sua esposa, mostrando como se vivia
e se viajava e se dava abrigo a estrangeiros naqueles tempos. Moisés foi também
um peregrino vindo dos desertos.
[Não
pude deixar de ter uma inveja profunda dos povos que viveram naqueles duros,
mas nos quais se podia ser integral. A vida do pastoreio, o céu estrelado, a
poesia e o espanto que se retirava da paisagem eram uma realidade
imediata. A técnica moderna nos libertou
de muitos sofrimentos e provações de trabalho, mas nos retirou algo
inestimável.]
Mas
acontece que eu leio a Bíblia e não posso deixar de dizer que o filme é um
disparate, partindo de um roteiro que modifica o texto da Bíblia e o faz de uma
maneira perversa. O livro do Êxodo é central na história da Salvação, sendo
caríssimo a judeus e cristãos. O filme é um insulto porque se percebe a má fé
de um diretor que não tem fé, que quis adaptar as maravilhas relatadas no texto
a um viés materialista, como se o texto fosse mentiroso ou falso. Moisés
existiu, ele deu eixo para o judaísmo e trouxe uma novidade histórica: o
confronto entre Deus e o Estado, senhor desse mundo. Deus é a única força capaz
de confrontar o poder dos faraós de todos os tempos.
As
maravilhas relatadas no livro aconteceram e foram para mostrar que, quem
conhece Javé, não pode compactuar e nem se submeter ao Estado idólatra.
Libertar o povo oprimido do Egito é um símbolo poderoso, pois é a própria
libertação do homem da submissão a Baal. Relata o enfrentamento do bem contra o
mal. Esse símbolo poderoso não fala apenas dos tempos épicos dos judeus no
Egito, fala de nós mesmos e de cada geração que viveu desde então. É preciso
sempre e sempre libertar o povo do Egito, que é apenas uma metáfora para falar
do Estado. É preciso sempre e sempre recuperar, a cada período, a tábua da Lei
eterna.
No
século XX vimos as consequências do que significa o crescimento de Baal, o
ídolo estatal. Tanto o nazismo como o comunismo são modernas formas de se
recriar a tirania do Faraó. É um padrão histórico. Vimos que o custo para se
libertar desse ídolo é imenso, quando contadas as vítimas e a destruição que
ficou pelo caminho.
O
filme mente de muitas formas, a começar por eliminar da história o cajado do
pastor que foi Moisés, instrumento de Deus para mostrar seu poder, transformado
na espada, instrumento recebido do próprio Baal. Um diretor de cinema que
renega o próprio texto que dá base ao roteiro perde o respeito instantaneamente
do público qualificado. O cinema não pode se transformar em narrativas
fantasiosas que modificam o texto, sobretudo quando se trata de matéria
religiosa. Na Bíblia, temos narrativas que são a expressão da verdade histórica
e sobre as quais não cabe qualquer tipo de interpretação que as modifique e
apequene. Ridley Scott já fez isso no seu malfadado Cruzada, que tanto
detestei.
O
filme mente ao narrar a maravilha do mar se abrir para a passagem do povo
hebreu. Não consigo deixar de comparar com o que fez Cecil B. DeMille no
maravilhoso filme de 1956, Os Dez Mandamentos. Lá vimos a recriação
cinematográfica fiel ao que está na Bíblia. Não foi um simples e lógico
abaixamento da maré que permitiu a fuga, a passagem, mas o imenso poder de
Deus, que tudo pode.
Outra
falsificação grosseira foi mostrar Moisés esculpindo as pedras da Lei, quando o
texto bíblico é explícito em dizer que Deus ele mesmo é que o fez. Na Bíblia,
Moisés escreve as leis somente depois que as pedras grafadas por Deus foram
quebradas.
Mas
a maior das falsificações está na introdução do personagem infantil que fala
pela boca de Deus. Não tem cabimento, porque na Bíblia não há intermediários
entre Deus e Moisés. Esse absurdo torna o filme uma blasfêmia, uma difamação do
nome de Deus. Torna o filme um lixo a ser evitado. Faz da história uma
narrativa tão falsa como se o diretor fosse o próprio satanás encarnado, contando
suas mentiras. O filme desinforma os espectadores menos letrados nas coisas
bíblicas e pegos desprevenidos. É lixo.
A
ideia de usar a imagem de uma criança para retratar Deus nasceu certamente da
leitura da obra de Jung, o psicólogo. Ele escreveu em muitos lugares, mas
sobretudo no famoso Resposta a Jó, que a psicologia de Javé era a de um menino
mimado. Obviamente Jung estava errado, pois não viu que a narrativa tinha que
ser compatível com o que aconteceu e o que aconteceu precisava acontecer e Deus
precisava fazer o que fez para libertar o seu povo do Faraó-Estado.
Esse filmeco não passa de uma sonora
blasfêmia. Como o Cruzada, do mesmo diretor.
FONTE: MÍDIA SEM MASCARA
http://nivaldocordeiro.net/
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